A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o benefício fiscal para as vendas a varejo de eletrônicos, como smartphones e notebooks, previsto para durar até 2018, não poderia ter sido revogado em 2015. A Lei do Bem (nº 11.196, de 2005) concedeu alíquota zero de PIS e Cofins a determinados produtos para incentivar a inclusão digital.
A decisão é um importante precedente para quem já questiona o assunto na Justiça. Considerando todos os contribuintes potencialmente interessados, a repercussão econômica da decisão é estimada em cerca de R$ 20 bilhões em valores de 2016, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
Em 2009, o benefício fiscal da Lei do Bem foi prorrogado até 2014, quando foi novamente estendido até 2018, pela Lei nº 13.097. Mas, no meio do caminho, uma outra norma, a Lei nº 13.241, de 2015, retirou a isenção fiscal às varejistas. O benefício ao industrial não foi revogado e persiste até 2029.
As varejistas alegam que incentivo fiscal concedido com prazo certo e com algumas condições não pode ser revogado a qualquer tempo, sendo incabível a revogação prematura. Já a Fazenda Nacional considera que a discussão é constitucional, pois cabe definir se uma lei poderia revogar benefício de alíquota zero instituído por outra lei.
Nos Tribunais Regionais Federais (TRFs) prevalecem decisões favoráveis à Fazenda Nacional. O recurso de uma varejista, portanto, chegou ao STJ. O relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho foi o primeiro a votar a favor das empresas, quando o julgamento começou, em dezembro de 2020.
Napoleão entendeu que a revogação antecipada causou enorme surpresa e prejuízo aos contribuintes, que “se fiaram” na conversa do governo. Ele acrescentou que o benefício fiscal visava atingir mais as camadas sociais do que os agentes produtivos.
O voto foi seguido pela ministra Regina Helena Costa e, na sessão de ontem, pelo ministro Sérgio Kukina. De acordo com Kukina, a previsão do Código Tributário Nacional (CTN) sobre isenção também se aplica a hipóteses de alíquota zero e não se poderia alterar as regras do jogo de maneira antecipada. Ficaram vencidos os ministros Gurgel de Faria e Benedito Gonçalves (REsp 1849819, 1845082 e 1725452).
O tema já está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF) em outro processo. Nele, há três votos no sentido de que a discussão é de natureza infraconstitucional (RE 1124753). A análise dos ministros do STF foi interrompida por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
Se o STF decidir que o assunto é infraconstitucional, a discussão se encerra no STJ, onde os contribuintes acabaram de vencer na Primeira Turma. Por ainda não existir precedente da Segunda Turma, a PGFN não tem como recorrer sobre o mérito no STJ.
De acordo com a procuradora Amanda Geracy, a Segunda Turma tem entendido em monocráticas pela natureza constitucional, portanto, não julga o mérito. A PGFN pretende recorrer desses casos direto ao STF.
De acordo com Ariane Guimarães, sócia do escritório Mattos Filho, e que atua na ação no STJ, a manifestação do STJ é um precedente para quem já discute o assunto na Justiça. Porém, alerta, as varejistas precisam ter continuado a seguir os requisitos legais até 2018, porque se trata de um benefício com contrapartidas.
Os requisitos estabelecidos em lei são de que: o produto seja adquirido de um fabricante no Brasil, no contexto do Processo Produtivo Básico e pratique os preços definidos no decreto. “A decisão não vale imediatamente para todo mundo, quem quiser se valer dela precisa ter ação própria”, diz Vinicius Jucá, sócio de tributário de TozziniFreire. “Quem não entrou com ação ainda pode entrar e aproveitar, de junho de 2016 a 31 de dezembro de 2018, se comprovar que antes da revogação usava o benefício fiscal, cumprindo as condições, e foi prejudicado.”